Lewis Mumford
Em seu segundo livro, A Condição de Homem (1930), o sociólogo americano discorre sobre a forma e as implicações de se viver em sociedades, que começaram a criar forma logo com o advento da imprensa, um século após o Renascimento. Na Europa, começaram a fundar-se novas escolas, universidades e mesmo pesquisadores e curiosos autônomos, grandes nomes da ciência e filosofia, como Galileu, Newton, Voltaire, Kant, Shakespeare e todos os pré-contemporâneos dos quatro séculos seguintes. Mumford é diversas vezes brilhante e romântico ao analisar este fenômeno histórico com a sua parcialidade e interpretação:
"Quando despojamos o homem de todas as suas funções como "membro de uma raça, povo, partido, família ou corporação", estamos reduzindo o domínio da personalidade; pois a personalidade emerge, não por um desapego do meio social, mas por uma assimilação e encarnação mais completa desse meio.
A integridade do indivíduo depende de sua associação
dentro de uma comunidade integral. Aqueles que fugiam aos direitos e
deveres da vida numa comunidade não obtinham liberdade. Ou ficavam
flutuando num sonho vão em que se compraziam, ou submergiam até uma
existência animal; existência de que davam prova por sua disposição para
violência, para a brutalidade, para a malvadez.
Em verdade, o desapego social é a morte. A todos os
instantes o indivíduo desapegado é alentado pelos labores dos outros
homens, pelos conhecimentos que ele adquiriu na sociedade, pelas
esperanças e sonhos que evocam suas origens sociais.
A imprensa acabou com o monopólio da cultura por uma
classe. Embora tal monopólio fosse por algum tempo e até certo ponto
conservado, por causa do alto capital exigido para instalação de um
prelo e por causa também dos privilégios restritivos conferidos pelo
estado a fim de controlar a produção e distribuição de livros, o fato é
que com o tempo a maquina tipográfica veio a ser um grande fator de
difusão da cultura e nivelamento cultural. Nenhum tesouro no México ou
em Cuzco se compara em valor à herança imaterial que, pela primeira vez
na história, agora se oferecia à posse e gozo da raça."
Passeando pelas 15 páginas que seguem neste mesmo capítulo, Mumford aborda meia dúzia de grandes eventos sociopolíticos decorrentes do advento da imprensa, como o Fascismo, o Totalitarismo, a impressão em livros e distribuição das descobertas dos cientistas e o a importância dos livros nas Universidades como fatores de transformação cultural. Infelizmente já naqueles tempos, década de trinta, ele acaba por concluir o capítulo com um parágrafo melancólico e assustador, donde é passível a interpretação de que a felicidade e a plena satisfação humanas não residem apenas na tecnologia e nas facilidades disponibilizadas pela ciência, mas na profunda espiritualidade e comunhão de nós, humanos.
O Homem Moderno preparou-se para a conquista do mundo exterior; tinha fé
nas maquinas e essa fé foi justificada pelas obras. Projetou sobre a
sociedade adulta o sonho infantil de poder ilimitado e antecipou-se a
uma época em que o botão elétrico fazia surgir a comida com a mesma
facilidade com que o choro do infante faz vir-lhe à boca a mamadeira ou o
seio. Porém depois de quatro séculos de esforço estrênuo seus míticos
poderes continuam ainda ilusórios. A despeito de suas maquinas, ele
continua passando fome no meio da fartura; não obstante seu conhecimento
de estrelas remotas e de mundos intra-atômicos, a civilização que ele
criou deu origem a uma barbaria que acaba de levar a ruína e a
devastação a todos os pontos do planeta. Numa serie de guerras mundiais e
mundiais revoluções, o que o Homem Moderno está de fato penosamente
conseguindo é suicidar-se."
Particularmente acredito sermos muito poucos ainda (passados quase cem anos) que atuamos como catalizadores de uma mudança no plano espiritual. Onde todos fazemos o bem para a humanidade e a biodiversidade, a atmosfera terrestre. São poucos ainda que pensam globalmente e agem localmente, como Capra havia dito em 1980 através das palavras do economista Schumacher. Basta olhar criticamente os atuais acontecimentos como a farsa que encenam os políticos na Rio+20, ou ver a máquina de fazer dinheiro e padronizar costumes que é a TV nacional. É possível olhar com esperança para o futuro, ainda creio nisto, mas essa geração precisa realmente despertar, o aumento populacional e a destruição global entraram em uma curva acentuada, em progressão geométrica, é preciso puxar os freios antes que seja tarde demais.